sábado, 11 de março de 2017

Gongando o Kong


E estreou essa semana o novo filme do King Kong, Kong - Ilha da Caveira. 

E o que achamos do filme? Podia ser pior. Mas é legal até certo ponto. 

Vamos falar das partes boas e vou falando do que me incomoda em relação à elas e depois falo do que é realmente ruim. 

O filme se passa em 1973, e pega exatamente os dias da retirada dos Estados Unidos do Vietnã (uma das locações do filme, inclusive) e isso claramente é justificado para a curiosa descoberta da Ilha da Caveira pelos primeiros mapeamentos com fotos de satélites. Claro que uma ilha envolta em uma tempestade que nunca acaba provavelmente já teria sido avistada de alguma forma, mas serve também para criar um tipo de mística quanto ao lugar, como se fosse um Triângulo das Bermudas do Oceano Pacífico. Em alguns momentos você quase tem umas recordações de Jonny Quest, um certo saudosismo das produções originais dessa época (pelo menos pra gente da minha geração, talvez). Isso é uma das partes boas do filme, pois não é uma época distante que precisa de mais cuidado com o visual e também não é uma época tão moderna em que os absurdos não são possíveis. 

Bill Landa (John Goodman)



Então, na premissa da história, Bill Randa (John Goodman) consegue permissão para acompanhar uma missão LandSat. O Landsat foi uma projeto da NASA que, à partir da segunda metade da década de 60, usou mapas para rastrear e observar recursos naturais terrestres. Meu, perfeito como desculpa para explorar uma ilha inexplorada, mesmo que isso lembre um pouco a premissa do King Kong de 1976 em que o pessoal buscava petróleo. Já se percebe que a organização governamental liderada Landa não está preocupada somente com recursos naturais e ele pede uma escolta militar. 

Cel. Preston Packard (Samuel L. Jackson)
Aí entra o nosso bom e velho Samuel L. Jackson como Coronel Preston Packard, um homem em retirada de uma guerra que ele não sente perdida, mas abandonada, um reflexo bem comum dos militares estadunidenses da época, que tinham a sensação de que a guerra poderia ter sido ganha se os tivessem deixado luta-la. Um homem inconformado com o desperdício de vidas de seus comandados. .
Mason Weaver (Brie Larson) e James Conrad (Tom Hiddleston)
Para completar a equipe, temos uma fotografa pacifista Mason Weaverm que atuou no Vietnã, vivida por Brie Larson, ganhadora do Oscar. A única mulher no elenco chega falando grosso, mais se equiparando aos brucutus com quem tem que lidar do que como uma personagem feminina. Dá a impressão que podia ser um ator que não ia fazer diferença, já que o foco do filme não é um macaco gigante apaixonado por uma loira gata. Justamente por isso é meio que desperdício uma ganhadora do Oscar estar em um filme pipoca. Não que quem ganhe Oscar não possa fazer papéis ruins ou genéricos, como é o caso. Afinal, todo mundo precisa ganhar a vida e por comida na mesa, não é mesmo?

Surpresa é o Loki, o nosso bom Tom Hiddleston, no papel do ex-SAS James Conrad, que o Sr. Landa vai procurar em um bar do sudoeste asiático com todos os clichês que já vimos em Braddock, De Volta para o Inferno, O Franco Atirador e tantos outros filmes que mostram alguém indo procurar alguém no submundo daquela parte do mundo. Ele age como o mercenário durão e já faz seu cartaz na entrevista de emprego sobre o porquê que ser tão valioso para os "cientistas". O ator é bom, mas talvez o personagem não fosse para ele. Não convence como o SAS. Tem uma velha piada russa que diz: "-Foram os americanos... - Como vc sabe? - Se fossem os SAS britânicos, só saberíamos que estiveram aqui de manhã; se fossem os israelenses, nunca saberíamos, pois os mortos não sabem de nada."


Então meio que o roteiro não me convence que ele seja um SAS especialista em sobrevivência. É como se faltasse alguma coisa para nos convencer disso, de que ele é o super trooper que um SAS deve ser. Principalmente nos pontos de conflito com o Cel. Packard, ficando só para bem próximo do final ver como isso se resolve. Por isso a solução e separar os grupos e tornar os dois núcleos separados para um contar como é a ilha e o outro quem é Kong. 


Dessa vez, os nativos são asiáticos em uma ilha do Pacífico, na verdade, vietnamitas mudos e a história do Kong é contada com a solução de acharem um náufrago que vive na ilha desde a Segunda Guerra, o Ten, Hank Marlow, interpretado pro John C. Reilly. Essa é a parte em que alguém conta a história e os mistérios da ilha para o público se ambientar na história em vez de adivinhar tudo ou o sábio ocidental deduzir tudo. É meio chato. Mas funciona melhor que achar nativos que falassem inglês. 

Hank Marlow (John C. Reilly) 
A fauna da ilha é apresentada aos poucos, depois do encontro dos helicópteros com o jovem Kong. Sim, o jovem Kong, já que o filme deixa claro que ele ainda não atingiu seu tamanho adulto, por isso ele ainda não é o "King". Se algumas partes de megafauna resultante de gigantismo insular é plausível dentro da premissa do filme, outras são meio deslocadas, como encontrar cervos. Eu esperava grande roedores anfíbios, como capivaras e antas, ou algo mais estranho. Pelo menos os grandes monstros da ilha satisfazem o desejo por ver monstros criando problemas para os estranhos. Achei a cena da aranha gigante muito interessante. 



Bom, claro, como mostra o trailer, que os exploradores encontram o Kong depois de lançar cargas sísmicas para explorar a formação geológica da ilha. Sim, isso era assim mesmo: alguém colocava sismógrafos especiais em algum lugar e alguém detona ou lançava cargas explosivas para que a reverberação do impacto pudesse ser detectada e ter um mapeamento. Hoje se usam radares e sonares e outros métodos menos destrutivos. Mas isso era o gancho para irritar Kong e mais uma razão para o filme se ambientar nos anos 70. E quando o macacão aparece pela primeira vez é legal. Você se convence de que não é exatamente um gorila, mas uma espécia de símio  



Esse primeiro encontro define duas grandes inspirações do filme: Apocalipse Now de Coppola e Moby Dick. O filme é uma homenagem à Apocalipse Now e O Coração das Trevas, de Joseph Conrad, o livro que inspirou o filme. O livro trata de um retrato do sistema colonial francês na África e é uma narrativa em primeira pessoa muito assombrosa. Eu amo o livro e o ritmo dele e como conta a história de alguém indo buscar o líder de uma unidade de exploração para devolvê-lo à civilização, mais ou menos como em Apocalipse Now. Vários personagens tem seus nomes tirados do livro, como James Conrad (Joseph, o autor), Hank Marlow (Charlie, o marinheiro), Chapman (O farol na entrada do Tâmisa entre 1851 e 1957). Faltou chamar alguém de Kurtz.


A revoada de helicópteros de Kong chega na ilha jogando suas bombas e tocando um bom rock em alto-falantes em um Huey. Acho que usar a Cavalgada das Valquírias não combinava com o clima do filme. Mas, é música e bombardeio e para os soldados, vindos do Vietnã e querendo voltar para o Mundo [1] é uma maneira de tornar tudo divertido. 


Claro que dá tudo errado e como um personagem diz "foi uma situação tática sem precedente o por isso não tínhamos como saber o que fazer". E nesse momento o Cel Packard se torna um Capitão Ahab buscando vingança contra a força da natureza que matou seus homens, como o Ahab da literatura quem vingança contra a baleia branca que arrancou sua perna. Sendo Samuel L. Jackson, isso se torna intenso e você assume que ele está errado por ir contra uma força da natureza. E isso se torna o foco dos conflitos quando os grupos se reúnem, pois Conrad não é como um Ismael que narra a história ou mesmo um Sr Starbuck. É algo entre isso e vai além, mas em vez de um Qui Queg temos a fotografa que poderia ser um fotografo que poderia nem estar lá.  

O conflito sobre certo ou errado ir contra a natureza
Uma vez em terra a exploração da ilha, lenta e deslumbrante parece, mesmo, uma ode a Fitzcarraldo e insignificância humana em sua luta com uma natureza inclemente, tanto quanto a arrogância do homem em tentar, com a sombra de, se conseguir, acabará por destruir a si mesmo, na máxima do arquiteto da própria destruição. Tanto nas artes conceituais essa citação a Fitzcarraldo poderia ter sido realmente escrachada no filme. 

Concept Art - Puxar um barco pela floresta... Fitzcarraldo total. 







Isso se comprova quando Kong não mata quando não precisa, enquanto o ser humano o caça por vingança. 

Agora falar do que realmente me incomodou, do que não gostei, daquilo que achei me chamaram de idiota.

1- O navio de carga que serve como porta-helicópteros leva claramente um CH-53 Sea Stallion no heliponto da popa e um CH-47 Chinook no heliponto da proa e quatro UH-1 Huey no convés central. 

Mas de onde, em nome de todos os deuses do ar e do voo, de onde eles tiraram e decolaram doze Hueys? Gente... 12!!! e só tinha 4 no conves!!!  E dois com o nariz pintado com a cruz vermelha de resgate em um hangar no castelo de popa que depois viram 3!!!


2 - São uma unidade de Cavaleria Aérea, com pessoal de helicóptero, que são pilotos, co-pilotos e artilheiros. As aeronaves não estão carregando pessoal de infantaria para uma missão, então falamos só das tripulações e de suas aeronaves. E morrem vários.

Onde foi que conseguiram um M2 Ma Duce .50 BMG com o tripé?
Gente, isso é pesado demais para ser levada por um soldado, fora a munição. Quando transportada pela infantaria, essa arma é desmontada e distribuída em uma guarnição de 5 soldados. 5!!! E pra montar isso num reparo tripé M3 não leva 15 segundos. 


3 - Lança-chamas foram usados no Vietnã, mas estavam na lista de armas especiais. Não tinha razão nenhuma para ter um lança-chamas numa missão de exploração, Não engoli essa também. 



Fora isso, o núcleo dos militares funciona. Parecem mesmo os caras que querem voltar pra casa depois da guerra enquanto outros viram guerra demais e outros viram guerra de menos. De fato, o único personagem que evolui no filme é o Cel Packard. Os outros, ficam daquele jeito. 

Para quem viu todos os filmes de King Kong, o pano de fundo mudo um pouco e isso é bom, mas no decorrer do filme se reconhecem as cenas, os truques e se percebe que não é um filme realmente novo, só os detalhes mudaram. Kong não vai para a cidade, não é capturado e fica apaixonado pela mocinha. Mas as lutas com a fauna da ilha, os monstros vilões e tudo mais, com tribo nativa e muro gigante estão lá, sem novidade. Ter um Ahab e não um empresário oportunista muda, dá outro ritmo, mas ainda assim tudo soa como se já tivesse sido visto em outro filme, mesmo que o conjunto funcione. 

Resumindo, Kong - Ilha da Caveira, é um ótimo filme para se divertir. Tem problemas, mas acho que sói pra gente chata como eu. Não deve agradar a todos, mas é algo a ser visto.

Inclusive porque é o primeiro de um universo cimatográfico já denominado de "Monsterverse" com o próximo sendo "Godzilla - King of Monsters" com precisão de lançamento para 2019 e "Godzilla vs Kong" em 2020. Justamente por isso, além de montar um universo compartilhado como a Marvel, também adotaram a cena de pós-crédito para falar do que vem por ai. Ao ler os créditos antes da cena, terá pista do que vai aparecer na cena. Então não saia correndo do cinema se quiser saber o que vem por aí. 

Kong - Ilha da Caveira (Kong - Skull Island, EUA, 2017)
Diração: Jordan Vogt-Roberts
Com: Tom Hiddleston, Brie Larson, Samuel L. Jackson, John Goodman John C. Reilly
Duração: 120m

Kong - Skull Island também gerou uma linha de brinquedos e action figures produzidas pela Lanard usando moldes do The CORPS. Não sabemos ainda se isso setá lançado no Brasil, mas já está disponível nos EUA e Europa.




[1] Quando no Vietnã, os soldados contavam os dias para voltar para o Mundo, ou seja para casa. quando faltava pouco tempo para voltar ao Mundo, eles estavam "Curtos" e já era o período que muitos começavam a reclamar de qualquer missão que pudesse mata-los e impedir sua volta para o Mundo.

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